Sob ameaça das construtoras que atuam no Minha Casa Minha Vida de parar obras já em maio, o governo decidiu liberar R$ 800 milhões adicionais para o programa de habitação popular.
O montante, nas contas das empresas, deve ajudar a cobrir R$ 550 milhões em desembolsos atrasados, mas não afasta incertezas para empreendimentos a partir de junho.
A liberação de recursos suplementares ocorreu após pressão das construtoras, principalmente as que atuam na faixa 1 do programa, destinada a famílias com renda até R$ 1.800 mensais. Nesse segmento, 90% do valor do imóvel é subsidiado com recursos do Orçamento, por meio do FAR (Fundo de Arrendamento Residencial).
Para 2019, a dotação orçamentária para o programa seria de R$ 4,6 bilhões.
Mas mesmo construtoras das faixas 1,5 e 2, em que o subsídio é menor, relatam atrasos e temem impactos financeiros. Uma suspensão nos recursos federais nesses segmentos afetaria em cheio até mercados mais maduros e empresas de grande porte em São Paulo, um dos poucos estados onde se esboça recuperação do setor imobiliário.
Dados do Secovi-SP (sindicato do mercado imobiliário do estado de São Paulo) apontam que metade das unidades lançadas em 2018 na capital paulista pertencia ao programa Minha Casa Minha Vida.
Para grandes companhias, paralisar obras é o último recurso, mas construtores ouvidos pela Folha relatam que suspenderam a procura por novos terrenos e estão revendo estratégias para futuras aquisições e lançamentos.
A prévia operacional do primeiro trimestre da MRV Engenharia, maior companhia do Brasil no segmento popular, aponta que a empresa não gerou caixa pela primeira vez em 26 trimestres.
Antes de o governo determinar a liberação de R$ 800 milhões, um empresário de uma grande construtora, que pediu anonimato, classificou o cenário como dramático e beirando a irresponsabilidade.
Outro disse que a situação é de caos, porque o governo não está conseguindo honrar com o cerca de 1,5% de participação que tem no programa.
A maior parte dos recursos para o Minha Casa Minha Vida vem do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), mas o fundo não pode aportar dinheiro enquanto o Tesouro Nacional não colocar sua parte, porque a manobra poderia ser considerada uma pedalada fiscal.
Empresários afirmam não entender a posição do governo, que, dizem, pregou o liberalismo econômico e a segurança jurídica para melhorar o ambiente de negócios, mas está promovendo uma quebra generalizada de contratos.
E lamentam uma situação que consideram desnecessária e contraproducente, já que a demanda no segmento popular existe e é o que vem sustentando o mercado imobiliário nos últimos anos.
Desde o começo do ano, as empresas que operam no programa reclamam de reduções nos repasses de valores.
Na primeira delas, que vigorou de janeiro a março, o governo desembolsou 1/18 dos valores previstos para cada mês, em vez do tradicional 1/12 equivalente à divisão mensal do Orçamento anual.
A frustração com as receitas no primeiro bimestre fez com que o governo anunciasse, em março, um novo contingenciamento de R$ 29,7 bilhões nos gastos do Orçamento.
No fim do mesmo mês, um decreto publicado pelo Ministério da Economia fixou novos tetos de desembolso para o MCMV, reduzindo em 39% o limite para pagamento do MDR (Ministério do Desenvolvimento Regional), que passou a gerenciar o programa após a extinção, neste ano, do Ministério das Cidades.
Na noite de quarta-feira (17), o MDR informou que, em abril e maio, os repasses para o programa serão de R$ 550 milhões. Em junho, o valor recua para R$ 500 milhões.
Folha de São Paulo